Nossa linda juventude
Em memória de Almir Stones
Apesar dos pesares e dos desencontros fica combinado
para a eternidade aquela visita e dessa vez não faltarei. Ah, prometo que levo
aquele vinil pra gente dançar entre anjos e querubins.
It's Only Rock'n'roll, e nós adoramos.
Beijo enorme!
Havia
uma pulsante efervescência de desejos nas nossas cabeças naquele final da
década de 70, e na seguinte elas foram fazendo sentido. Enfrentávamos aqueles
idos com nossos cabelos longos, ideologias e exuberantes doses de rock and roll.
As manhãs dos sábados posteriores ao
dia do pagamento da fábrica eram preenchidas como uma caudalosa visita a
discoteca do saudoso supermercado Eldorado, em Campinas, ou na Galeria do Rock,
na Avenida São João em São Paulo, onde nos deliciávamos com centenas de Lp’s de
rock. Desembarcávamos em Valinhos, talvez mais visionários, já que o ar da
cidade grande nos entorpecia de felicidade e esperança. Da rodoviária até as
nossas casas, desfilávamos com nossos cabelos longos ao vento, com um ou outro
riffs na cabeça e um exemplar do jornal “A Classe Operária”, debaixo do braço.
O país estava imerso num isolamento
político e cultural. Pensávamos a política como expressão da liberdade e dentro
dela sonhávamos com os nossos ídolos nos palcos próximos das nossas
possibilidades. 1981, um ano possível. Mochila com meia dúzia de coisas básicas
(que somente os maiores de 50 anos sabem) e necessárias para sobreviver ao
tempo passado. Cabeça feita com muito rock and blues rodando em 33 rotações por
minuto no velho Garrard inglês, botamos o pé na estrada numa dessas embarcações
que nos deposita no contratempo de Woodstock, Altamont Free Concert, Saquarema,
Iacanga. E lá fomos nós sacolejando num micro-ônibus, triscados por coloridas
batidas alcoólicas e outros que tais para dentro do Estádio do Morumbi. Queen,
destino final.
Os portões se abrem e uma avalanche humana
invade o estádio. Corríamos alucinados sobre aquela grama, tapete dos deuses do
futebol, agora, nosso tapete voador e mágico que nos conduzia para voos
rasantes pelas aspirações que viriam para o futuro. Ah, quantos símbolos foram
necessários para caminharmos a juventude. Na escuridão mirávamos um ponto de
luz no longínquo palco de nossas vidas e lá estava ele, iluminado. Como num
show em Londres, Tokyo ou New York, lançávamos nossos isqueiros com suas chamas
para o alto na esperança de iluminar ainda mais o nosso deus Mercúrio, love of
my life. Baby, ainda há tempo passado para nós, vamos?
Garotas e garotos estão por todos os lugares.
Uns profetas, outros poetas. Todos crentes que outra história sempre será
possível. Essas intermináveis novas construções coletivas, mistura de tudo que
já foi, será o novo vivido a ser vivido. Mistura tudo, biscoito fino e manda.
E o novo será? Será!
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Gérsio Pelegatti é professor da
História não aposentada
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